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Santo Agostinho

sábado, 18 de agosto de 2012

Questionamento do acordo de Itaipu é tiro no coração do Mercosul

É o que afirma o reportagem de Fábio Cervone, colunista do site R7.  Veja a seguir.

A recente atitude do Paraguai, que pretende rever os acordos em torno da usina de Itaipu, representa um golpe certeiro no motor e no coração do Mercosul (Mercado Comum do Sul). O rio da Prata (que engloba os rios Paraná, Paraguai e Uruguai), onde se localiza uma das usinas hidrelétricas mais produtivas do mundo, faz parte há 200 anos dos acordos de paz e de desenvolvimento dos países do cone sul.

O mundo em que vivemos hoje segue uma das leis mais primitivas do homem: a luta por recursos naturais, como água, luz, alimentos, minérios e outras matérias-primas. É essa força que comanda as decisões das diferentes nações, principalmente pelo fato de o planeta Terra ser limitado. Por isso, ao projetar uma integração regional, como ocorre na América do Sul por meio do Mercosul, a geografia se torna a base do relacionamento entre os Estados.

O Mercosul, além do objetivo imediato de criar um mercado comum, com livre circulação de bens e mão de obra, tem como ponto fundamental os acordos envolvendo a partilha da bacia do rio da Prata (veja o mapa) e de seus afluentes. Não à toa, os quatro países fundadores do bloco (Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai) são banhados por essa bacia.

Uruguai e Paraguai: dois opostos no Mercosul

A bacia do Prata sempre foi um problema espinhoso, que inclusive provocou pelo menos duas guerras de razoáveis proporções (guerra da Cisplatina e a guerra do Paraguai).

Argentina, Brasil, Uruguai e Paraguai — este especialmente interessado nos rios, já que não possui saída para o oceano — foram obrigados a se entender em relação à região para evitar constantes e destrutivas inimizades, como ocorrido nos períodos de guerra. Este acordo inicialmente permitiu a utilização compartilhada do rio, possibilitando a conexão do Paraguai ao Atlântico e aos territórios dos demais países ali localizados, fosse pelo transporte hídrico, pela irrigação, pela força aplicada em rodas d'água (ou outros mecanismos rudimentares de aproveitamento energético) e a pesca.

Mais tarde, com o desenvolvimento da energia elétrica e das hidroelétricas, as bacias que dividem os quatro países do cone sul se tornaram ainda mais importantes. O potencial energético foi rapidamente compreendido, os interesses cresceram, e a região ascendeu em termos estratégicos, concretizando sua importância geopolítica. Em 1969, sob a liderança brasileira foi assinado o tratado da Bacia do Prata, que visava promover maior integração econômica e de infraestrutura entre os países da região.

Neste sentido, durante a ditadura militar brasileira e o longo governo do general paraguaio Alfred Stroessner (1954 a 1989), as duas nações concretizaram o acordo, assinado em 1973, para construir na época a maior hidroelétrica do mundo e, até os dias atuais, umas das maiores realizações da engenharia moderna, a usina de Itaipu.

A instalação da hidroelétrica foi feita no lado brasileiro da fronteira, mas a enorme intervenção causada no Paraguai e a ligação geográfica entre as duas margens do rio Paraná forçaram os dois países a ratificar um acordo de cooperação. O investimento da empreitada foi organizado pelo governo brasileiro, mas a energia produzida pela usina é divida igualmente entre os dois parceiros.
O acordo entre brasileiros e paraguaios incomodou profundamente os vizinhos argentinos, então comandados por Juan Domingo Perón e María Estala Martinez de Perón, até 1976.

Os argentinos não só partilhavam a soberania da bacia do Prata como eram ameaçados diretamente por uma possível destruição de sua capital, Buenos Aires, por enxurrada, caso Brasil ou Paraguai abrissem de uma só vez as comportas da gigantesca represa criada para o funcionamento de Itaipu.

Finalmente, em 1979, durante o regime militar argentino, foi assinado o acordo tripartite (Três partes: Argentina, Brasil e Paraguai), que dava as garantias legais aos argentinos, assegurando um cenário que não ameaçasse a segurança nem os interesses do vizinho. O tratado incluía a construção de outra usina hidroelétrica, desta vez envolvendo apenas a Argentina e o Paraguai. A usina de Yacyetá foi finalizada apenas em 2011 e está localizada 400 km abaixo de Itaipu, na fronteira entre os dois países.

Esta construção funciona não apenas como geradora de energia, mas também como anteparo para um imprevisto que cause a liberação excessiva das reservas de água de Itaipu na região, evitando um desastre.

Mesmo não envolvido diretamente na construção das usinas de Itaipu e Yacyetá, o Uruguai, como banda oriental do rio da Prata, fez parte do processo de integração como observador ou mesmo como membro ativo dos acordos.

Estes fatos formaram os primeiros aparatos jurídicos que obrigaram a coexistência pacífica e, assim, a inevitável integração entre estes países da América do Sul.

A partir do momento que Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai concretizaram a parceria na bacia do Prata, o processo de integração se tornou praticamente irreversível. Isso significa que esses países inseriram em seus projetos individuais de nação a coexistência com os demais vizinhos, a divisão de recursos naturais e a necessidade de trocar informações.

O comprometimento de Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai com a integração regional gira em torno da bacia do rio da Prata, uma característica geográfica destes vizinhos, e, por isso, crivada nos DNA dos respectivos Estados. Como em outras regiões do mundo, estes países possuem entre si laços carnais que os conectam, já que suas riquezas se originam e correm para a mesma fonte.


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